Cláudia Gomes, Diretora da Divisão Editorial do Porto na Porto Editora, Conversa Com (A)Gente esta semana. Na casa há 24 anos, Cláudia foi a responsável pela criação do catálogo literário da Porto, em 2005, e tem entre seus autores nomes como o português Valter Hugo Mãe e a brasileira Martha Batalha. Neste bate papo, ela fala sobre o impacto da pandemia no mercado editorial português, sobre sua relação com Valter Hugo Mãe e sobre a experiência de publicar Martha Batalha na terrinha.
VB&M: A Covid 19 impactou as dinâmicas mercadológicas no mundo todo e as indústrias foram obrigadas a se reinventar. No que diz respeito ao mercado editorial, os danos da pandemia e as maneiras de reagir e lutar para diminuir prejuízos variam muito de um território a outro. Quais foram os impactos da Covid no mercado do livro português e de que modo a Porto está lidando com os desafios deste momento difícil?
CG: O mercado do livro em Portugal mantém, nesta altura, uma queda de mais de 20% (year-to-date) em relação ao ano anterior. Vários gêneros tiveram quedas superiores, como os guias de viagem, por exemplo. Os meses de lockdown e fechamento de livrarias mostraram uma grande procura por livros infantis de atividades, reflexo da necessidade de manter os mais jovens entretidos dentro das quatro paredes. O comércio online cresceu bastante, mas nunca compensando as perdas de vendas dos espaços físicos. Depois da reabertura, a evolução tem sido bastante lenta, mas já se nota um redirecionamento do interesse dos leitores para a ficção, e os nomes bestseller que costumam lançar livros novos nesta altura estão a ganhar tração.
Da nossa parte, temos tentado potencializar a comunicação e a divulgação através dos canais digitais, fazer eventos e apresentações online e publicar livros que interessem ao maior número de leitores possível. Estou com esperança de que o Natal reavive o amor ao livro e à leitura, que nos lembre de como o livro é o presente ideal para todos – diversidade, facilidade de compra, rapidez na entrega e um valor para a vida.
VB&M: Você é a editora do grande autor português Valter Hugo Mãe. Como explica seu imenso sucesso não só em Portugal mas também no Brasil?
CG: Tem tudo que ver com o poder da sua escrita, tão espantada quanto poética. Também com o fato de o autor acreditar no amor nas suas múltiplas dimensões e de alguma forma essa mensagem estar presente nas suas obras. Os livros do Valter são humanos e nós precisamos de humanidade. E de beleza também.
VB&M: Para o leitor brasileiro, Valter Hugo Mãe é mais do que um escritor, um verdadeiro ídolo, que reúne multidões quando faz lançamentos em livrarias e feiras pelo país (esperemos que sejam possíveis no próximo ano) e que desperta imensa curiosidade de toda gente. Você pode nos contar um pouco de sua amizade e sua relação profissional com o autor?
CG: Valter tem um poder de comunicação fora do comum. Ouvi-lo em qualquer apresentação, conferência, etc., impacta-nos de uma forma impressionante. Ele consegue criar proximidade com um público que é invisível, falar do óbvio e do banal filosoficamente, ou de assuntos de maior profundeza com humor.
O Valter tem um coração enorme e, depois de pouco tempo de relação profissional, é impossível não querermos ser seus amigos, fazer parte de um círculo privilegiado que num mesmo minuto ri e chora com suas conversas. Creio ter a sorte de ele ter aceitado a minha amizade. Honra-me muito e faz-me feliz.
VB&M: A Porto é a editora portuguesa de Martha Batalha, cujo segundo romance acaba de ser publicado sob o título UM CASTELO EM IPANEMA. O que você vê na ficção da Martha que lhe parece atraente para o leitor português?
CG: O fato de as histórias da Martha relatarem a falta de autonomia e individualidade das mulheres em tempos que não são muito distantes, e numa sociedade que fez parte da história de muitas famílias portuguesas. A voz de Martha é fresca mas acutilante, sem excessos. Com humor, ela trata temas tão importante como o papel da mulher no mundo e as desigualdades sociais.
VB&M: Acredita que poderemos nos encontrar pessoalmente em 2021 em Frankfurt, ou em Lisboa, ou no Rio?
CG: Como poderia não acreditar? Temos de viver com esperança de um mundo normal, não é mesmo? E se for no Rio, ainda melhor!