Lorella Belli soube cedo que viria a ser agente literária. Italiana radicada em Londres, começou no mercado editorial britânico em 1996 e, em 2002, fundou sua agência, a LBLA, que representa autores de sucesso no Brasil e no mundo como Robert Bryndza, Dreda Mitchell (ambos pela Autêntica no Brasil) e Taylor Adams (este, pela Faro). Às vésperas de celebrar 20 anos de agência, Lorella CONVERSA COM (A) GENTE sobre sua carreira e experiência, seus interesses, o escopo de atuação da LBLA e o catálogo construído. Ela comenta, ainda, as mudanças no mercado editorial nos últimos 20 anos, os livros de sua lista em que mais acredita nesta temporada e os planos para festejar o 20º aniversário da agência na próxima Feira de Londres, em abril. Sobre a profissão que exerce e pela qual é apaixonada, é taxativa: “Quando descobri a profissão de agente literária, percebi que era o que eu queria fazer, uma vez que envolveria tanto a criatividade (por exemplo, descobrir e trabalhar com autores em seus livros) como negócios (por exemplo, apresentar suas obras e negociar os direitos com editores), pois amo esses dois lados da atividade igualmente”.
VB&M: O que a motivou a criar a Lorella Belli Agency?
LB: Sempre fui apaixonada por livros, pessoas e idiomas; desde a adolescência, eu sabia que provavelmente trabalharia como jornalista ou no mercado editorial. Quando descobri a profissão de agente literária, percebi que era o que eu queria fazer, uma vez que envolveria tanto a criatividade (por exemplo, descobrir e trabalhar com autores em seus livros) como negócios (por exemplo, apresentar suas obras e negociar os direitos com editores), pois amo esses dois lados da atividade igualmente. Então, comecei a tomar medidas que me permitiriam adquirir experiência na indústria, visando a tornar-me uma agente. Primeiro, escrevi minha dissertação de mestrado sobre a história do agenciamento literário (“O Agente Literário como Negociador e como Promotor da Literatura”). Isso me proporcionou um bom entendimento sobre como e o quê os agentes realizam, permitindo-me conhecer um grande número de agentes (e suas diversas abordagens e gostos) e, depois trabalhar, em várias agências literárias e departamentos de direitos em editoras de Londres ao longo dos anos. Em meu último emprego antes de fundar a LBLA, tive de criar uma nova lista de autores do zero em outra agência conhecida, então na prática comecei a construir minha lista de autores naquele momento (muitos ainda estreantes), que me acompanharam quando decidi criar minha própria agência alguns anos mais tarde, em 2002.
VB&M: Como o meio editorial britânico recebeu uma agência baseada em Londres dirigida por uma profissional italiana?
LB: Fundei a LBLA em 2002, mas trabalhava na indústria editorial em Londres desde 1996, então eu já tinha uma boa rede de colegas e pessoas que conheciam a mim e ao meu trabalho quando a nova agência foi estabelecida. Eu já havia vendido vários livros até então, os editores estavam familiarizados com meu trabalho. Também fizera alguns amigos próximos no meio editorial, e tive muita sorte em ter grandes mentores que me inspiraram e me encorajaram quando mencionei que iria criar minha agência. Em última análise, a disposição dos meus autores em me seguir nessa nova aventura tornou a decisão mais fácil. Mas minha maior mentora e inspiração foi minha mãe, que gerencia seu negócio com muito sucesso na Itália (embora nada tenha a ver com mercado editorial). Acho que, para mim, foi mais uma questão de quando eu deveria fundar a agência, e não se eu deveria dar esse passo. Até onde sei, não havia nenhum outro agente italiano em Londres na época, então eu estava muito consciente do fato de que eu era diferente de certa forma, criada em uma cultura distinta, e tinha uma visão diferenciada sobre muitas coisas, e personalidade também. Particularmente, eu tinha um grande interesse em assuntos internacionais e atraentes para uma audiência e um público global, em vez de um conteúdo centrado na Grã-Bretanha. As minhas diferenças se tornaram minha força e distinção; conforme percebi que meus interesses e gostos não eram os mesmos dos meus colegas, pude capitalizá-los ao mesmo tempo em que trabalhava nos projetos que amava. Até hoje, a LBLA é conhecida por nosso alcance internacional e a habilidade de representar autores e publicar clientes ao redor do mundo, fechando centenas de vendas de direitos de tradução por ano, assim como vendendo direitos de língua inglesa para Grã-Bretanha, Estados Unidos, Austrália e produtores audiovisuais.
VB&M: O que você vê como a mudança mais profunda na agência e no mercado do livro desde a inauguração da LBLA em 2002? Se falamos de dois mundos diferentes, o que permaneceu igual?
LB: Globalmente e entre os países anglófonos em particular, na literatura comercial, eu diria que a única grande mudança foi o crescimento do digital (ebooks primeiro, cerca de 20 anos atrás, e, mais recente, áudio e streaming). Isso introduziu novos produtores e empresas para as quais os agentes também poderiam vender, uma vez que grandes editoras criaram selos focados em livros digitais e novas editoras independentes surgiram (incluindo a bem-sucedida Joffe Books Ltda, Bookouture Ltda, que agora integra a Hachette UK, Crux Publishing e Silvertail Books, todas com as quais trabalhamos ao longo dos anos, gerenciando os direitos de tradução, de áudio e audiovisual). O grande sucesso da Amazon como livraria global, assim como a criação do programa KDP (Kindle Direct Publishing), impulsionou a auto-publicação independente em grande escala. O fato de leitores e escritores poderem compartilhar seus materiais online e a popularização da fanfiction há cerca de 8 ou 10 anos estão ligados à explosão de vendas digitais e à nova oportunidade que a internet ofereceu aos autores. Então, além de representar autores cujo trabalho seria publicado por editoras tradicionais, assumimos autores que já haviam deixado sua marca, alcançando milhões de leituras online em sites de fanfiction (por exemplo, Sophie Jackson e Kirsty Moseley, que já tinham uma grande base de seguidores – milhões de leituras online – e nós pudemos ajudá-las a capitalizar essa exposição e fechar vendas de seis dígitos com editoras de língua inglesa – Gallery nos EUA e Headline Publishing na Grã-Bretanha para Jackson, e Forever nos EUA e Little Brown na Grã-Bretanha para Moseley) e concluindo dezenas de contratos de direitos de tradução (incluindo editoras brasileiras) para eles. Outras autoras auto-publicadas best-sellers que representamos hoje são Nicola May e Holly Martin, que venderam centenas de milhares de livros em inglês, cujos direitos de tradução estão negociados em diversos territórios. Tudo isso não existia há 20 anos, quando criei a agência, e foi uma grande oportunidade para expandir o mercado e oferecer mais opções aos autores.
VB&M: Como você define os livros e autores que representa?
LB: Nós representamos ficção geral (desde ficção de gênero a ficção upmarket, incluindo leituras para clube do livro, policiais/thrillers/suspenses, ficção feminina, romances, narrativas históricas) e não-ficção popular (memórias, biografias, popularização científica e histórica, psicologia, autodesenvolvimento, soft business, narrativas não-ficcionais. Basicamente livros sobre assuntos em alta e voltados ao leitor comum.
VB&M: Você poderia descrever os vários tipos de obras que você busca na agência?
LB: Somos agentes primários da maioria dos nossos autores, isto é, trabalhamos com eles na edição antes de apresentar sua obra a editores e negociar os direitos de tradução pelo mundo, assim como os direitos audiovisuais. Também temos editoras como clientes, outras agências literárias (vendemos direitos de tradução e direitos de língua inglesa em nome de agências literárias americanas, por exemplo) e editoras (em nome de quem negociamos direitos de tradução, áudio e audiovisuais)
VB&M: Qual é a atividade mais recompensante no seu trabalho?
LB: Descobrir novos autores talentosos e livros especiais e poder negociá-los em todos os idiomas e formatos possíveis, para o máximo de editoras, maximizando a exposição e a visibilidade das obras, expandindo a base de leitores e nos certificando de que a remuneração que recebem pelo seu trabalho seja a melhor possível.
VB&M: O que pode ser desafiador ou até mesmo frustrante?
LB: Passamos grande parte do tempo buscando respostas, pagamentos, aprovações; então é ótimo quando recebemos retornos rápidos ou pelo menos uma confirmação de que o problema está sendo resolvido de maneira breve e eficiente.
VB&M: Durante essa última temporada de Frankfurt (virtual), quais novos títulos do seu catálogo despertaram mais interesse?
LB: Aqui está a capa do nosso catálogo para a Feira de Frankfurt, mostrando alguns dos destaques.
Isso deve dar a vocês uma ideia do quão ampla é a nossa lista, indo desde suspenses e thrillers best-sellers (incluindo a fenomenalmente bem-sucedida Joy Ellis, no topo da lista; o premiado autor Rick Mofina, também best-seller; o novo thriller de Taylor Adams, HAIRPIN BRIDGE, cujo antecessor, NO EXIT, foi vendido em 33 territórios e vai ser adaptado para o cinema pela 20th Century Fox com estreia marcada para março de 2022) a THE SMART WOMEN’S GUIDE TO MURDER, uma deliciosa série policial de Victoria Dowd, vencedora do People’s Fiction Prize, já vendido em diversos territórios.
Na ficção mais literária e upmarket, o muito elogiado THE GOSHLIGHTS, de Gráinne Murphy, e I AM THE SEA, de Matt Stanley.
Na ficção histórica feminina, a série PARADISO, de Francesca Scanacapra (para fãs de Elena Ferrante, Sebastian Faulks, Fiona Valpy, Santa Montefiore, Irene Nemirovsky, Victoria Hislop e “A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batata”). No romance contemporâneo, nossa super-estrela número um de vendas, Nicola May, cuja trilogia FERRY LANE foi adquirida pela Hodder/Hachette na Grã-Bretanha em uma venda de seis dígitos (sua obra foi vendida em 14 idiomas até o momento). Na ficção jovem-adulta, o brilhante romance de Josie Williams (pense em uma mistura de “Ghost” com “Romeu e Julieta” e “Cidade dos Ossos”, para leitores de Jennifer Armentrout e Nicola Yoon).
Na psicologia popular, YOU ARE NOT MEANT TO BE HAPPY, SO STOP TRYING, de Rafa Euba, e em desenvolvimento pessoal, JUST ASK: Why Seeking Support is Your Greatest Strength, de Andy Lopata, já vendido para a Alemanha, China e Vietnã desde a feira de Frankfurt. Na ficção infantil, a série best-seller de Jemma Hatt que vendemos para a Polônia, Estônia e Finlândia.
VB&M: Qual das suas leituras recentes lhe deu mais prazer?
LB: Além dos novos livros de autores e clientes, livros que estiveram na minha lista de leituras que eu consegui ler recentemente e gostei são I AM, I AM, I AM, de Maggie O’Farrell, WHY WE SLEEP, de Matthew Walker, e PRETENDING, de Holly Bourne.
VB&M: Como você pretende comemorar seus 20 anos como agente em 2022?
LB: Se a Covid permitir, teremos uma grande festa de 20 anos no dia 5 de abril de 2022, no primeiro dia da Feira de Londres. Como formamos muitas relações maravilhosas nesses anos com editores na Grã-Bretanha e ao redor do mundo, escolhemos essa data porque queremos que o máximo de colegas e amigos possível se juntem a nós na comemoração e compartilhem do sucesso com o qual eles contribuíram. Será o dia em que a maioria dos editores e co-agentes estrangeiros estará em Londres. Temos muita esperança de que poderemos receber e abraçar mais uma vez nossos maravilhosos co-agentes brasileiros, o time esforçado e bem-sucedido da VB&M que faz um trabalho incrível por nossos autores e clientes no Brasil, apesar das circunstâncias atuais e econômicas que podem ser desafiadoras na maior parte do tempo, especialmente nos últimos anos.
De resto, basta ficar de olho e nos seguir no Twitter (@lblaUK) e no Facebook para descobrir quais outras surpresas nós temos para esse aniversário muito especial em 2022.