Cezar Tridapalli, autor de VERTIGEM NO CHÃO (Moinhos), indica a leitura de “Estrangeiros residentes: uma filosofia da migração” (Ayiné, 2020), de Donatella di Cesare. A tradução do italiano é do próprio Cezar.
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Apesar de complexa, “Estrangeiros residentes” é uma obra muito clara. Leitura fundamental para quem quer entender o movimento das migrações, hoje e ao longo dos tempos. Entendendo a história das migrações, compreendemos boa parte da história do mundo. Referindo-se ao ódio que o autóctone – o pretenso cidadão original – manifesta contra o migrante, Di Cesare afirma:
“Não é um ódio natural e espontâneo. É mais cultivado, nutrido, alimentado. Segue modelos, implica padrões e caminhos: o gesto discriminatório, as ideias de humilhação, as palavras de zombaria. No centro do rancor coletivo está o indivíduo finalmente livre para odiar. Mas o ódio livre tem pouco a ver com a liberdade. Ser livre para odiar é uma triste condenação. E é indício de frustração existencial, fanatismo identitário, impotência política. De um lado o ‘nós’, de outro o ‘não nós’, obscuro e monstruoso, repugnante e detestável, culpado pelo ‘nosso’ mal-estar – não importa como, não importa por quê. Mas culpado.”
Não sei se preciso ou consigo dizer mais. Quando leio, vêm-me à mente os tantos ódios contemporâneos. Traduzir “Estrangeiros residentes” – portanto, lê-lo com vagar, palavra a palavra – produziu em mim inúmeras pausas reflexivas. Comecei o trabalho poucos meses depois de ter lançado VERTIGEM DO CHÃO, romance em que tento, com os recursos da ficção, falar sobre fronteiras geopolíticas e do corpo.