TALVEZ VOCÊ DEVA CONVERSAR COM ALGUÉM

Na busca de trechos destacados em obras que compõem significativas bibliotecas pessoais, visando a fazer a coluna semanal A Frase Sublinhada, VB&M intuiu que circulava entre os amigos do blog um título muito atual que – à exceção de alguns parágrafos iniciais – poderia ter uma edição toda marcada por seus mais de 70 mil leitores no Brasil (número de exemplares físicos e digitais vendidos). TALVEZ VOCÊ DEVA CONVERSAR COM ALGUÉM, da escritora e terapeuta americana Lori Gottlieb, lançado em 2020 pela Vestígio/Autêntica, rapidamente tornou-se um dos grandes best-sellers de não-ficção da pandemia e tem sido lido com paixão, intensamente sublinhado por todos que mergulham em sua narrativa.

O livro mescla histórias de quatro pacientes de Gottlieb com as próprias experiências da autora em sua terapia, fornecendo a perspectiva de ambos os lados do divã e convidando a uma reflexão sobre a vulnerabilidade humana. Esta semana, excepcionalmente, o blog oferece 12 trechos sublinhados por admiradores e admiradoras do livro. Nenhum trecho foi sugerido mais de uma vez, apesar de alguns leitores terem oferecido várias frases sublinhadas. Pegamos um único trecho de cada convidado. Houve contribuições de dentro da agência, de Anna Luiza e Yasmin (Luciana leu TALVEZ na prova da edição americana da HMH, em 2018, e já não tem mais suas marcas).

As frases sublinhadas aqui reunidas mostram a quem ainda não leu o livro, mas segue este blog, que TALVEZ VOCÊ DEVA CONVERSAR COM ALGUÉM tem algo de especial a dizer a cada leitor, a cada indivíduo. Sobre luto, perda, culpa, a busca do sentido da vida, a dificuldade de lidar com os próprios sentimentos e limitações e tantos outros temas inerentes à condição humana. Às vezes, não sempre, é possível identificar o olhar profissional na frase escolhida. As frases foram dispostas segundo ordem de entrada na edição da Vestígio.

*

“Não podemos ter mudança sem perda, motivo pelo qual é tão frequente as pessoas dizerem que querem mudar, mas mesmo assim continuarem exatamente iguais.” p. 16 – Bebel Sader, diretora da Bossa, agência de marketing digital e presencial. (Trecho sublinhado na edição americana da leitora.)

“Um dos passos mais importantes da terapia é ajudar as pessoas a assumir responsabilidade por suas crises em andamento, porque uma vez que elas descobrem que podem, e devem, construir suas próprias vidas, veem-se livres para gerar mudanças. Contudo, frequentemente, as pessoas sustentam a crença de que a maioria dos seus problemas é circunstancial ou situacional, ou seja, têm causas externas. E se os problemas são causados por todos e por tudo, por algo alheio a elas, por que deveriam se dar ao trabalho de mudar a si mesmas? Mesmo que decidam agir de maneira diferente, o resto do mundo não continuará o mesmo?” p. 19 – Luciane Fontes Cançado, terapeuta.

“A terapia provoca reações estranhas porque, de certa maneira, é como pornografia; ambas implicam um tipo de nudez; ambas têm o potencial para excitar e ambas têm milhões de usuários, cuja maioria mantém seu uso privado.” p. 29 – Maria Eduarda Lemgruber, advogada.

A única saída é atravessar. A única maneira de se chegar ao outro lado do túnel é passando por dentro dele, e não o rodeando.” p. 30 – Raphael Pasqualette, advogado.

“Mas ela sabe. Sabe o que todo terapeuta sabe. Que o problema atual, o assunto que alguém traz, é frequentemente apenas um aspecto de um problema maior, se não um engodo completo. Sabe que a maioria das pessoas é ótima em encontrar maneiras de filtrar as coisas que não quer enxergar, em usar distrações ou defesas para manter sentimentos ameaçadores à distância. Sabe que deixar emoções de lado apenas faz com que elas fiquem mais fortes, mas que antes de entrar e destruir a defesa de alguém — seja esta defesa uma obsessão por outra pessoa, ou fingir que não vê o que está bem diante de si —, precisa ajudar o paciente a substituir a defesa por alguma outra coisa, e assim não deixar a pessoa despreparada e exposta, sem qualquer tipo de proteção. Como o termo indica, as defesas servem a um propósito útil. Elas protegem as pessoas de traumas, até não serem mais necessárias.

É nessa elipse que os terapeutas trabalham.” p. 57 – Yasmin Ribeiro, assistente na VB&M.

“Acima de tudo, não queria cair na armadilha que os budistas chamam de compaixão idiota, expressão adequada, considerando a visão de mundo de John. Na compaixão idiota, você evita balançar o barco para poupar os sentimentos das pessoas, ainda que o barco precise ser balançado, e sua compaixão acaba sendo mais nociva do que sua honestidade. As pessoas fazem isso com adolescentes, cônjuges, viciados, até consigo mesmas. Seu oposto é a compaixão sábia, que significa importar-se com a pessoa, mas também lançar-lhe uma amorosa bomba de verdade, quando necessário.” p. 61 – Paula Lobato, roteirista e redatora publicitária.

“Como é mais fácil nos tornarmos proteladores da morte! Muitos de nós não dão o devido valor às pessoas que amam e às coisas que acham significativas, para no fim perceber, quando nossa data limite é anunciada, que andamos patinando no projeto: nossas vidas.” p. 79 – Michelle Mendlewickz, consultora de sustentabilidade. (Trecho sublinhado na edição americana da leitora.)

“O insulto da amante — de que eu mais pareço sua prostituta — era mais complicado, mas imagino que ele tenha feito a brincadeira dos cinquenta minutos pelo mesmo motivo que a maioria das pessoas o fazem; elas gostariam de poder ficar mais tempo, mas não sabem como dizer isso diretamente. Reconhecer seu apego faz com que se sintam vulneráveis demais.” p. 109 – Manuela Malta, advogada.

“Os homens tendem a estar em desvantagem aqui, porque normalmente não foram criados para ter um conhecimento prático de seus mundos internos; para eles, é menos aceitável, socialmente, falar sobre seus sentimentos. Da mesma forma que as mulheres sentem uma pressão cultural para manter sua aparência física, os homens sentem essa pressão para manter sua aparência emocional.” p. 159/160 – Alberto Flaksman, economista, produtor de cinema e tradutor.

“[…] a liberdade envolve responsabilidade, e existe uma parte na maioria de nós que acha a responsabilidade assustadora.” p. 171 – Anna Luiza Cardoso, agente literária na VB&M.

“Quando comecei, no entanto, ocasionalmente sentia-me pressionada a dar conselhos do tipo benigno, ou era o que eu acreditava. Mas então percebi que as pessoas se ressentem de que lhes digam o que fazer. Sim, elas podem pedir que lhes digam, repetida e incansavelmente, mas depois que você cede, o alívio inicial que sentem é substituído por ressentimento. Isso acontece mesmo se as coisas correm bem, porque, no fundo, os seres humanos querem ter poder sobre suas vidas, motivo pelo qual as crianças passam a infância pedindo para tomar suas próprias decisões. (Depois, elas crescem e me pedem para acabar com essa liberdade)” p. 254 – Carolina Bernal, médica pediatra.

“Quanto mais você acolhe sua vulnerabilidade […], menos medo sente.” p. 401 – Mariana Bernal, analista de políticas públicas.